sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Rachados e Esquecidos

Imagem: Américo Nunes


O sereno cai sobre a noite fria. Os paralelepípedos do Recife Antigo sentem a presença sombria do desconhecido. O vento assobia uma melodia tenebrosa e o canto da coruja avisa que algo está por vir. O uivo dos cachorros afina a sinfonia do medo que se espalha em segredo por cada beco estreito. A névoa encobre cada passo dado, os olhos enxergam assustados por não poderem ver. Quando de repente surge entre as ruas...

Poderia ter sido assim. Seria bem mais intrigante, não acham? Todo um misticismo em volta, daria no mínimo um filme, ou então um livro de Jô Soares, com suas dezenas de pistas e de suspeitos. É, mas não foi. Foi à base da paulada mesmo.

Extra, extra! Chico Science é encontrado ferido. Por estar sem baquetas, não teve como reagir, mas ainda assim, não deixou que os bandidos levassem sua alfaia.

O que levaria um ser que possua um pouco mais de meio neurônio estragado a fazer isso?
Bertolt Brecht, grande dramaturgo alemão, disse: “Triste do povo que precisa de heróis”. Pois é Brecht, nós precisamos sim. E só precisamos porque temos. Se valorizamos? É claro que sim. Espalhamos estátuas deles por aí. Não ver o Recife? É cheio. E não venha me dizer que elas não servem para nada. Vai dizer que nunca viu nenhum bêbado proseando com Ascenso Ferreira ali no Cais da Alfândega?

Bêbado:

- Seu Incenso, o senhor sabe que te considero, né? Adoro aquele poema seu que diz:

Hora de comer – beber!
Hora de dormir – beber!
Hora de vadiar – beber!
Hora de trabalhar?
-Aí vamo pro bar que ninguém é de ferro!


Mas será que podemos chamar nossos poetas de heróis? Mesmo sem usarem capa ou cueca por cima da calça, ou então fumarem charutos e liderarem revoluções mais famosas por suas camisas?
Declamar dores. Reclamar valores. Acalentar o desconforto da vida com palavras que invadem a mente de quem as lê como um raio x quente e fulminante. Um instante de sossego provocado pelo apego do sentimento às paredes de cada veia. Já velhas, mas que mesmo assim, apontam o curso para que as hemácias, plaquetas e os glóbulos de quaisquer cores que sejam surfem em ondas gigantes de alívio e paz. Ah, a paz. Não é isso que os super-heróis trazem? Eita, mas aí já são “super”, não heróis. Quantos heróis formam um super? São iguais? Quantas perguntas. Pelos poderes de Greyscow! Eu tenho a força! Eu tenho heróis. Eu tenho poetas. E Brecht, me desculpe, mas não sou triste não.


Salvem a Ama-Zona!

Consertem Chico.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

MInistério da Merda adverte: comemore com parcimônia.

Imagem: Américo Nunes

E eis que somos coroados com as Zoolimpíadas. Quanta responsabilidade. O mundo todo nos olhando. Não vamos falhar. Titubear, jamais. Seremos impecáveis. Entregaremos todas as obras antes do prazo. Vamos calar a todos, vamos fazer as melhores Olimpíadas que esse universo já viu. Pronto, já falou o brasileiro. Agora, com a palavra, o ser humano.

Primeiro, parabéns a toda equipe médica que operou esse milagre. Mais um para coleção do Lula. Pré-sal, Copa do Mundo, Credor do FMI, só falta a cura pro câncer. Vamos lá, você consegue presidente. Dia 2 de setembro, o Brasil inteiro parou para ver a sentença, quer dizer, a benção vinda de Copenhague. Que chocolate. Com um recheio tão doce, que pode ficar amargo no final. Tipo esse que os estudantes ainda estão sentindo com o “To ÉNEM aí” que está acontecendo. Mas para as Olimpíadas é bem diferente. Estão todos aí, aqui e ainda tem os que hão de vir, por vir, para rir. É a realização plena de mais um plano de fuga. Quantas rugas vão nos render? Vamos ver. O importante é que o Rio de Janeiro continue lindo. Será que vai rolar outro pacto de trégua com os traficantes? Só assim para a linha vermelha ficar verde e amarela. Mas vamos deixar de pessimismo. Vamos voltar a ser brasileiros e não seres humanos. Será tudo lindo, com os morros todos enfeitados com bandeiras, não de facções, mais sim das nações que atracarão nesse porto seguro. Eita, Porto Seguro é na Bahia, mas não importa, o Brasil todo será o Rio. Que orgulho. Unidos pela causa. Que coisa. Teremos tiros sim. Muitos. Mas apenas no barulho dos shows pirotécnicos que vão anunciar a entrada do crak na favela, numa visita, é claro. Vários arrastões por dia. Incansáveis perseguições aos nossos soldados. Vamos lá, heróis de uma população sem heróis. A nós, só nos resta saldar a esperança e soldar nossa fé nessa torcida. A torcida para que o evento não cresça mais que o povo. Não camufle a verdade e mostre de fato todos os fatos. Será que é possível haver Brasil durante as Olimpíadas? O que vamos ver? Vamos ver? Prio! Sinceramente...só tenho uma coisa a dizer:

Salvem a Ama-Zona!